Oração de um quase ex-alcóolatra II

Textos antigos, 2011

Hoje comemoro 50 dias sem beber. Pra mim, muito.

Não estou aqui para dizer que nunca mais irei beber. Pois, mesmo que eu nunca mais beba – o que não acredito – penso que eu continuarei para sempre com essa vontade.

Há 14 anos que não fico tanto tempo sem beber.

Há 25 anos comecei a beber, ou seja, um quarto de século bebendo.

Tenho os meus próprios motivos.

Não quero beber para esquecer que a desigualdade habita o mundo, mas quero ser capaz de ser feliz e agir mais, consciente de que ela existe.

Não quero beber para menosprezar meus problemas, mas quero ter forças para consertar aquilo que pode ser consertado e aceitar aquilo que não o pode ser.

Não quero beber para conseguir ser mais sexy e engraçado durante um jantar romântico, mas quero que a mulher com quem eu esteja seja capaz de ver essas qualidades em mim e de aceitar os meus defeitos.

Não quero beber para ser um cara divertido e, para isso, procuro recordar-me de que Charles Spencer Chaplin nunca bebeu.

Não quero ter de ouvir coisas do tipo: “Que isso… Um copinho não faz mal a ninguém…” como se “não beber” fizesse de alguém uma pessoa anormal e não quero fazer mal ao meu corpo, pois, afinal, só tenho esse.

Estou cansado desse atalho para o início, desse Jogo das Cobras e das Escadas onde sempre voltamos pra casa primeira.

***

A possibilidade de me verem bebendo em um futuro próximo é enorme, mas quero deixar claro aqui o que desejo.