O poeta lógico

Metamorfose, 2022

Nunca tinha lido um livro de poesia e li aquele por acaso. Alguém o tinha colocado por engano entre os livros de engenharia da biblioteca. Achei o título engraçado. Quase ridículo. “Leia este livro e vire um poeta”. Como se fosse possível transformar pessoas como eu em poetas. Acredito nos números, no pensamento racional, nas decisões frias baseadas na razão. Mas levei o livro comigo, apenas para mostrar a mim mesmo e ao mundo que estava certo.

Em casa, sentei-me no sofá.

Pra já, as primeiras páginas melhoraram meu humor. Estavam plenas de ironia. Odiava tanto poesia que comecei a ler aqueles parágrafos com alguma paixão. A poesia, eu não conhecia nada sobre ela. Os poetas eram vagabundos; eu, carreirista. Depois, de repente, desmaiei de tanto rir. Ri de uma rica rima que ridicularizava a rigidez. Tinha dado de cara com o Drummond. Dobrei a orelha da página. E eu que calculava, caçoava, camuflava. O Urso Polar não me deixou indiferente. E era verso pra cá, e era verso pra lá, e era verso pra cima, verso pra todos os lados. Se virava uma página, dava de cara com mais figuras de imagem, se virava outra página, dava de cara com ainda mais figuras de imagens. Simples sons serenos que passavam como serpentes sem sentir resistência. “Deuses meus da Engenharia! Que livro é este!”. Não era um livro, era um buraco negro, de onde nem a luz seria capaz de fugir. Os números sempre me haviam acompanhado dia e noite e agora estavam ali, cada vez mais para longe. Os poetas somos pessoas bizarras. Assim, pouco a pouco, o homem que eu tinha sido até então foi sendo coberto por sete palmos de páginas calorosas. O calor confortante daquele livro havia preenchido toda minha vida, e a noite carinhosa enfim me abraçou, e eu beijei os meus sonhos como se a adolescência tivesse se deitado de novo na minha cama, apaixonada, louca, onipresente.

Eis o que agora sou. Poeta.