O infinito

Textos antigos, 2011

Antônio atravessou a Rua Nossa Senhora de Copacabana e parou diante de Maria Pilar.

– Eu te amo – ele disse.

Maria Pilar deu dois passos para trás e sorriu, e sei que foi por ter sentido certo nervosismo.

Não podia ser. Ela não poderia deixar que aquilo acontecesse. Era uma mulher independente e não poderia permitir que agitassem o mar tranquilo de sua existência.

Ela olhou para trás e correu até a esquina, entrando no primeiro táxi que conseguiu.

– Para onde, senhora? – o taxista perguntou-lhe.
– Para longe daqui.

O taxista dirigiu quase durante meia-hora e parou quando ela disse para parar. Ela pagou-lhe a corrida, saiu do táxi e partiu, e o motorista ficou ali, a observar as costas de seu vestido. Ele questionou-se sobre o que poderia ter-lhe acontecido, mas logo ele voltou a olhar para frente e começou a pensar de novo no seu próximo cliente. Trabalhava na praça havia mais de vinte anos e já vira de tudo, inclusive punks como aquele, a pedir para que o levassem até o aeroporto, dizendo que estava com pressa. Todos estavam com pressa. O punk pagou o novo valor marcado no taxímetro, saiu do fusca e foi para o portão de embarque, para a fila da companhia aérea com a qual iria viajar. Ele deu o seu passaporte para uma funcionária, ela olhou para a sua foto, olhou para a cara dele, folheou algumas páginas do documento e perguntou à sua colega se o seu chefe já havia chegado. Sua colega disse que sim, que ele estava falando com o comandante do avião, para quem ele estava pedindo um favor: levar um urso de pelúcia para uma sobrinha que morava na cidade para onde aquele voo estava indo. O capitão sorriu, pegou o embrulho e entrou no aparelho, sentando-se ao lado do copiloto, um jovem que fora tratado com todo amor e carinho por sua mãe, a empregada mais antiga daquela padaria alemã. E como ela amava aquela profissão. Ela lançou a bola de farinha sobre a mesa, e a violência do ato lançou farinha para todos os lados, assustando o gato, que saiu da cozinha pela porta traseira. Susto maior, todavia, ficou para o galo, que, vendo o felino aparecer no quintal, bateu as asas e pousou em cima do poleiro. A porta do poleiro caiu, o pato bateu as asas, um cão não muito longe ladrou, e o carteiro mais idoso daquela cidade temeu por sua segurança e resolveu entregar primeiro as cartas da casa seguinte, cujo proprietário era seu amigo de infância. Ainda devia-lhe uma cerveja por causa da última aposta que haviam feito e tinha certeza de que iria recuperar a sua perda no próximo jogo, pois, afinal, não era à toa que sua equipe havia pagado tanto para ter Arnold, o zagueiro de mais de dois metros de altura capaz de dar medo aos adversários apenas com sua presença. Diziam que ele era o diabo, diziam que sua estatura era tão grande quanto aquela de uma turbina eólica, mas ele não respondia mal às pessoas por causa disso. Apesar de as turbinas estarem criando tantas controvérsias naquele país, a grande parte daquela população era a favor das energias renováveis. Apenas precisavam tomar algumas precauções, pensavam, já que todos sabiam que aqueles modernos engenhos eram perigosos para os pássaros, inclusive para o Gypaète Barbu, símbolo daquela gente e daquela nação, que tão heroicamente fora criada por Fritz Heins, pai de cinco filhos, avô de vinte netos e bisavô de trinta bisnetos. E não era verdade que preferira o seu filho mais velho aos outros, e sua esposa sempre soubera disso. Fritz amara todos os seus filhos com a mesma intensidade, mesmo quando comprava munições especiais para o seu primogênito no depósito do tio Manfred, cujo longínquo descendente estava agora doente, internado no hospital Friedrichshain Landsberger, sendo tratado pela enfermeira Ana Rodrigues Von Kurows, brasileira, filha de um emigrante alemão. Seus pais haviam partido para o Brasil no meio do século XX e de lá nunca mais haviam voltado; e o casal havia ficado triste com a partida de sua caçula para a Europa, mas havia também ficado orgulhoso de ela ter desejado conhecer a terra de seus antepassados. E, agora, como forma de pedir-lhe proteção aos céus, o casal estava mensalmente dando comida e roupas para a paróquia do seu bairro. Não era muita coisa, mas aquele pouco já fazia a alegria de muitos, de Helena da Cruz, mãe de três filhos, prima do José Gregório, o porteiro do prédio Santo Cristo, no qual Antônio morava.

– Olá, seu Antônio. O senhor tem uma visita – disse José Gregório, abrindo-lhe a grade da portaria.
– Visita?

Ele olhou para a sala de espera de seu prédio e viu Maria Pilar, de pé, sorrindo. Antônio caminhou em sua direção, e eles beijaram-se.