#eleNão
Outros, 2018
Eu tinha 15 anos quando tentei surfar pela primeira vez. Foi em 86, no Leblon. Foi a primeira de quatro tentativas. Minha prancha tinha uma quilha quebrada (a do meio), e não consegui nem mesmo ultrapassar a marola, mas um acontecimento iria marcar minha vida.
Na areia, um repórter e um “cameraman” estavam à procura de uma entrevista.
Eu já havia saído do mar quando ouvi: “vamos entrevistar o surfista aqui”.
– Você tem medo da morte? – o repórter me perguntou e me pediu para que olhasse para a câmera enquanto responderia.
– Tenho como acho que todo mundo deve ter – respondi –, pois, no final, a gente não sabe se acaba tudo ou se a gente se vê, enfim, diante de Deus.
O repórter me olhou durante alguns segundos e foi embora sem se despedir.
No dia seguinte, uma amiga me disse que tinha me visto no programa Viva a Noite e não sabia que eu era surfista – algo que não desmentiria –, mas, ainda naquele domingo, eu havia chegado em casa e chorado, porque – acredite! – tomara consciência de que havia negado Jesus Cristo em cadeia nacional, antes mesmo das três primeiras músicas do Show de Calouros daquele domingo.
E por que contar essa história agora? Por que depois de tanto tempo? Para me emendar e afirmar numa rede social que sou espírita. Pois é. Nem todas as pessoas que conheço sabem disso. Eu acredito na reencarnação, na pluralidade dos mundos, na existência da alma, na evolução constante do espírito, no rico que vai voltar pobre, no pobre que vai voltar rico e em Jesus Cristo. Não como o filho único de Deus, mas como uma alma que também nasceu ignorante e que, através de várias reencarnações, terminou por evoluir. Eu acredito no caminho do Buda, no estilo de vida do Gandhi, na liberdade encarcerada do Mandela, nas preces do Bob Marley, na coragem do Martin Luther King, na guerra do Arjuna, no amor incondicional do Maomé e na mudança política do Malcolm X. Eu acredito que todos nós um dia alcançaremos o sentimento de compaixão depois de inúmeras vidas (até mesmo Stalin, Mao Tse-tung e Hitler) e, hoje, estou aqui para também falar de política. Aliás, foi para isso que comecei toda esta ladainha.
O espiritismo é como um surfista em cima de uma prancha, equilibrando-se sobre dois gases. Se o ser humano ficar apenas na borda da inteligência, ele cai; se ele ficar apenas na borda da moral, também. Com a política também é assim. Se o eleitor ficar apenas na borda do fascismo, ele cai; se ficar apenas na borda do totalitarismo da esquerda, também.
Claro que você pode votar em quem quiser e não penso que você tenha de acreditar no que acredito – a cada um segundo suas obras –, mas acho que com uma coisa você tem de concordar: nós temos de votar com consciência e com precaução, pois nossas escolhas dizem muito sobre quem a gente realmente é.
Hoje, estamos vivendo um momento muito delicado no Brasil. Hoje, muitas pessoas – espíritas, católicos, crentes, budistas, ateus – estão pretendendo votar no Bolsonaro apenas para não verem o PT voltar ao poder, mais ou menos como aconteceu na Alemanha de 1938, quando Hitler foi nomeado Chanceler apenas porque muitos acreditaram naquela história de que a culpa era dos judeus.
Não estou dizendo que o Bolsonaro, se eleito, fará o que o Hitler fez – longe disso –, mas uma coisa é certa: ele é fascista, racista, machista e homofóbico, e se você for realmente for votar nele apenas para mostrar seu desagrado com o PT, tudo bem, mas não me diga que você não é, ao menos, um cúmplice daquilo que ele representa, como aqueles milhares de alemães que viveram ao lado de Auschwitz e que, no final, tiveram de recolher as cinzas. Eu não! Aqui está minha posição! Eu não votarei no PT no primeiro turno, mas se, no segundo turno, eu tiver de escolher entre Haddad e Bolsonaro, entre Lula e Bolsonaro, entre um preso político (já que o Aécio, o Temer e tantos outros estão soltos) e um cara que homenageia a tortura e já disse o que disse, eu votarei com todo o coração no PT, porque se alguém for bater em algum homossexual na minha frente, em algum comunista, em algum maconheiro, em alguma pessoa por causa de sua cor, em algum religioso em particular, em alguma mulher, eu vou me meter no meio e vou gritar: “não!”, porque sabemos que “para que o mal triunfe basta que os bons fiquem de braços cruzados”; e que me matem por causa disso. De onde quer que esteja, eu tentarei sentir compaixão por você.
O PT roubou? Roubou. Mas todos os políticos que têm estado aí também têm roubado (inclusive a família Bolsonaro), e o PT também fez coisas boas.
Durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma – futura senadora –, eu me lembrei do que Chico Xavier dissera durante as semanas de ódio que antecederam o afastamento do então presidente e hoje senador Fernando Collor de Mello, para que as pessoas rezassem por este. Hoje, eu irei rezar pelos simpatizantes do fascismo, para que na próxima noite tenham o mesmo sonho que o Dr. King teve.
– Não – diria eu hoje. – A vida está apenas começando.