A água da vida

Textos antigos, 2011

– Meu filho – meu pai disse-me enquanto amarrava a ponta de uma corda no gargalo de uma garrafa – aqui dentro você encontrará aquilo de que você precisa.
– Eu…
– Deixe-me terminar.

Abaixei o braço e segui seus movimentos, com a esperança de que aquilo fosse brincadeira. Não era.

– Aqui está o antes, o agora e o depois. Aqui está a sua paz.
– Eu… – era impossível resistir. Meus lábios estavam secos.
– Escute.

Meu pai puxou a corda com força. A garrafa estava bem atacada.

– Sei que isto pode estar-lhe parecendo incompreensível, mas confie em mim. Você é a pessoa mais valiosa que eu tenho, e eu apenas desejo o seu bem.

Ele levantou-se, e dei um passo para trás. Ele era o homem mais alto que eu conhecia. O homem mais alto e… o mais injusto!

– Mas…

Senti vontade de avançar em sua direção e arrancar a garrafa de suas mãos, de me lançar sobre ele e de gritar. Senti vontade de sair dali correndo, de mudar de nome e de amaldiçoar a vida. Senti até mesmo vontade de puxar a corda de suas mãos e de estraçalhar aquela transparência. Se eu não o podia tê-la naquele momento, não a desejaria mais. Senti vontade de muito, senti vontade de tudo! Contudo, fiz pouco.

Meu pai passou a ponta livre da corda por cima de uma estrela e puxou-a até às alturas, levantando a garrafa muito acima de nossas cabeças. Depois, ele amarrou a mesma ponta também no gargalo e deu-me a certeza de que ele havia calculado o mínimo de corda necessário para fazê-lo.

Ele afastou-se um pouco e sorriu para o pingente. Ele, então, olhou para mim.

Olhei para a garrafa pendurada e coloquei-me embaixo dela. A luz da lua tocava-a e criava luzes por todo o deserto. Estiquei o braço e tentei alcançá-la, mas nada consegui. Coloquei-me nas pontas dos pés e tentei de novo alcançá-la, mas ainda não consegui alcançá-la.

Olhei para o meu pai.

– Tudo o que você precisa fazer é esperar. Apenas esperar. – ele disse.

E partiu.

Olhei de novo para a garrafa e recuei. O universo pareceu-me grande demais. Muito tempo. Teria de esperar muito tempo. Mas iria esperar.

– O tempo que for preciso.